quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

O Muambeiro do Jabaquara

Tudo foi acontecendo meio que sem querer na vida de Jobson. Aos 15 anos, na volta de uma viagem a Disney, ele se deparou com a primeira oportunidade de negociação. Com as malas cheias de muambas, ele se viu obrigado a se livrar de alguns itens para não entrar em conflito com seus pais.

Vendeu para um colega de classe um tênis Asics branco. Para o Toninho, da casa ao lado, ele negociou o moletom da Puma verde limão e o Mickey de pelúcia. Para ambos, ele jurou que estava vendendo pelo mesmo valor pago nos EUA e que ele não estaria ganhando nada com isso.

Aos 19 anos, Jobson ganhou uma nova viagem de férias como prêmio por ter entrado na faculdade. O roteiro incluía dois dias na Argentina antes de ir para os Estados Unidos. Nessas viagens, não pensou nele nem na família, foi para os maiores outlets das grandes marcas negociar preços. Comprou tênis, blusas, camisetas, jaquetas, relógios e óculos de marcas famosas.

Na sua volta, o papo com os amigos era o mesmo, que tinha comprado, mas ficou grande ou pequeno, ou que ia dar para alguém que não gostou. Enfim, conseguia convencer todos os amigos a comprar os produtos pelo preço estipulado. Que, segundo ele, era bem mais barato que o encontrado no Brasil.

Essas viagens ao exterior foram ganhando força. Não demorou para ele começar a receber encomendas e ser conhecido pelo nome por quase todos os vendedores das grandes marcas mundiais. Ele tinha um cartão especial de quase todas as marcas e recebia emails diários das promoções. Tinha amigos até mesmo nos aeroportos, o que facilitava muito o seu trabalho.

Uma vez chegou com uma camisa da seleção brasileira, de origem incerta,  autografada pelo Luis Fabiano e fez leilão com os amigos do trabalho. Como não conseguiu nem de perto o valor desejado, acabou vendendo para único colega que não teve coragem de recusar a oferta pela metade do preço.

Cara jovem, bom papo, Jobson também era bem atento com o que acontecia ao redor. E foi almoçando no trabalho que ele ouviu um papo na mesa ao lado que mostrou novas oportunidades de negócio. Era um aparelho que, conectado com a TV a cabo, conseguia abrir todos os canais pagos, como futebol, filmes pay-per-view e muito mais.

Ele não pensou duas vezes. No dia seguinte estava na Santa Ifigênia, região central de São Paulo, para comprar o aparelho. Não via a hora de fazer o teste em casa e ver se o produtor era bom mesmo. E realmente funcionou, todos os canais estavam realmente liberados.

Depois de um tempo assistindo Sexy Hot e For Man, resolveu traçar um plano para ganhar dinheiro com isso. Chamou todos os vizinhos do prédio para dar um pulo no apartamento e conferir a demonstração. Ele explicou que com uma assinatura simples da TV a cabo e esse aparelho, todos teriam canais de graça.

Dos 52 apartamentos do prédio, ele fechou 50 pedidos. Passou a mão no telefone e ligou para o Caveira da loja da Santa Ifigênia e fez a encomenda de 50 aparelhos. Na negociação, Jobson ganhou outros 5 aparelhos de graça, que logo vendeu na repartição onde trabalhava.

Com o passar das semanas, sua fama cresceu e ganhou o apelido do “Rei do GatoNet”. Em pouco mais de dois meses, já havia vendido aparelhos para todos os prédios da rua onde morava no Jabaquara. O dinheiro ganho já era o suficiente para ter um pouco de luxo e tranqüilidade.

A operadora de TV a cabo recebeu um enxurrada de ligações de pessoas querendo reduzir o plano vigente e estranhou o fato de todos serem do mesmo bairro. Enquanto, a direção da operadora organizava uma força-tarefa para tentar descobrir o real motivo dessas reduções de plano, Jobson já negociava os aparelhos na região do Paraíso, com ajuda de Laura e Letícia (as irmãs), e na Vila Maria, com o apoio do Web Designer.

Jobson começou a ter sua vida monitorada, seus telefones grampeados, suas correspondências violadas e até mesmo seus cartões internacionais passaram por uma auditoria. Com a prisão do Caveira na região central e a apreensão de 600 aparelhos – destaques de todo o noticiário – Jobson viu o cerco fechando e com apenas uma alternativa de fuga: ir para a cidade onde ele era tratado como rei, Americana, interior do Estado.

Lá todos conheciam e todos protegiam o garoto prodígio que desde cedo ganhava dinheiro negociando na cidade. Escondido no porta-malas do carro de seu amigo Matheus, chegou a Americana, onde adotou um novo nome e uma nova profissão. Às vezes se envolvia em algumas atividades um pouco suspeitas. Com o nome de Ataulfo, ela já mira um cargo de vereador na cidade.

Esse foi mais um conto da série de Os Paulistas. Não perca na próxima quarta-feira "O Sorriso de Interlagos".

9 comentários:

  1. Eu conheço esse cara. Já comprei algumas coisas com ele. Tem um aparelho lá em casa que funcionou apenas na primeira semana.

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  2. Esse cara está fazendo falta lá na Sta. Ifigênia. Depois que ele se mudou para o interior, minhas vendas caíram...

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  3. Muito bom. O Blog está bem bacana. Parabéns. Contos sempre divertidos.

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  4. Como faço para encontrar esse muambeiro? Quero fazer umas encomendas....rs

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  5. Esse muambeiro pelo menos é chique. Vai para os EUA. E tem TV a cabo....

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  6. Boa. Qual é a próxima história?

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  7. Sensacional. Parabéns aos autores. O site está cada vez melhor.

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  8. O conto e realmente muito interessante, porem a vida de muambeiro nao passa nem perto do que esse garoto viveu, sou tb muambeiro e sei que a vida é dura demais, nao se ganha tanto dinheiro como antigamente. Os aparelhinhos da N.E.T (vulgo tia bet) vendo mais de 50 por mes so na internet.

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