quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

O MARIDÃO DA VILA MARIANA

Mário era um cara bem tranquilo, 28 anos, casado e bom entendedor de política. Sempre de olho do D.O., nos jornais, nos programas de rádio e TV. Casado com Joyce, jornalista de um grande portal de notícias, estava sempre atualizado com as últimas do dia.

Ele passou por um momento de indefinição na sua vida, sem saber o rumo profissional a ser tomado. Seus patrões não sabiam se queriam continuar com ele e isso afetou muito seu jeito de ser. Começou a não ter horário para entrar no trabalho, batia o cartão e sumia. Segundo ele, era melhor não estar visível para não lembrar que queriam demiti-lo. Começou a trabalhar em um lugar escondido no estacionamento da empresa e também em uma das cabines do banheiro. Estava certo que essa era melhor alternativa, ficar “invisível”. Durante dois meses ele batia o cartão, mas ninguém o via na repartição.

E a fórmula funcionou, Mário foi mantido no emprego e viu seu colega de mesa ser dispensado. Estava radiante, mandou um email para todos os amigos para convidá-los para uma cervejada e comemorar o emprego mantido. Tudo estava voltando ao normal.

Ele só foi pego de surpresa quando soube que sua esposa foi enviada ao Rio de Janeiro para cobrir os trabalhos de resgate das vítimas das chuvas na região serrana. Com o caos que tomou conta da região, ela foi obrigada a se alojar no 18º Batalhão do Corpo de Bombeiros de Petrópolis. A corporação era conhecida como “Surfistas do Bem”, pois a grande maioria dos profissionais era composta por surfistas sarados e cheios de boas intenções.

Todos os dias, Mário acompanhava a cobertura feita pela esposa no site de notícias. Achava super bacana o trabalho de Joyce, mas também preocupado com os riscos de uma outra forte chuva.

Em uma dessas matérias publicadas, havia uma foto da repórter mostrando a área destruída pelas chuvas. Mário, observador que é, percebeu que a esposa saiu de "papagaio de pirata" no fundo da foto e viu dois roxos na esposa, um na perna e outra no braço.

Preocupado, imediatamente ligou para a esposa para saber se ela estava bem, se estava passando por alguma dificuldade. Questionada sobre os dois roxos no corpo, Joyce explicou que foi provocado pelo tenente Paulão, que a segurou quando ela quase caiu de uma ribanceira. “Ele salvou minha vida. Devo muito a ele”.

As chuvas deram uma trégua, o sol voltou a brilhar no Rio de Janeiro, os trabalhos de buscas já se encerraram, mas mesmo assim, dois meses depois, Joyce segue acampada no Batalhão do Corpo de Bombeiros sem data prevista para retornar a São Paulo. Ela mudou o foco de suas matérias, ao invés de cobrir as chuvas e mostrar o drama das famílias desabrigadas, a jovem jornalista agora só escreve sobre os atos heróicos do Batalhão e sobre a preparação destes profissionais para as situações de emergência. Vira e mexe Joyce está na academia com eles ou até mesmo fazendo uma sauninha com a turma após os treinamentos.

Para Mário, segue o consolo de que ela continua escrevendo sobre a força e a coragem dos bombeiros cariocas. Ele morre de orgulho dela. Na semana passada, em um jantar com os amigos, ele contou com um belo sorriso no rosto que Joyce, pelo trabalho realizado no Rio, recebeu um convite para se tornar correspondente do portal na cidade. “Esta é minha mulher, uma baita profissional. Faz qualquer coisa para emplacar uma boa matéria”. 


"O Maridão da Vila Mariana" é mais um conto da série "Os Paulistas".

6 comentários:

  1. Muito bom! Desse jeito é bom ele assistir baywatch. A mulher dele não volta mais pra São Paulo....rs

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  2. Hi...depois que ela experimenta o Rio fica difícil voltar...

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  3. É importante ressaltar que, enquanto a esposa agarrava-se à sua próxima boa e grande matéria, o marido comia a mocinha responsável pelo café na repartição, o que botou abaixo seus planos de permanecer invisível.

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  4. Logo mais ela vai virar surfista... Ou seria "Surfistinha"? rs...

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  5. Muito legal!!!
    Só achei um pouco brusca a mudanca de foco. Em um momento ele estava invisivel e mantinha o emprego e de repente o foco muda para a mulher no Rio.
    Mas gostei...

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