Luma Dália era uma caixeira-viajante que gostava de frequentar restaurantes badalados e finos, em especial o über italiano “Temmês”. Lá, amiga dos gerentes da casa, ela se sentia em casa. E sempre gostava de pedir direto um secondo piatto, acompanhado de um monstruoso copo de cerveja de 1,5 litro.
Para espanto da clientela local, formada por integrantes da high society paulistana, após o segundo ou terceiro copo, ela tinha o hábito de gritar: “garçom, pre-pa-ra outro”. Mas ficava por aí. Sossegava em seguida, pedia, com gentileza, para que desligassem o ar-condicionado e pagava a conta com seu cartão bancário universitário – que ela ainda usava cinco anos depois de formada.
Luma morava no bairro paulistano da Saúde, mas por conta de seu ofício, cada vez menos ia pra lá. Certa manhã, enquanto saía atrasada para a próxima viagem foi abordada pelo porteiro Kerrysonn.
“Dona Luma, bom dia. Posso falar uma coisa pra senhora?” Luma, meio distraída, balbuciou um “diga”, enquanto procurava a chave do carro na bolsa. “O nome deste bairro foi dado em homenagem à senhora?” Luma não entendeu direito: “como, seu Kerryson?”. “É porque eu acho que a senhora tem saúde pra dar e vender”. Luma, impávida por um breve instante, respirou fundo, meneou a cabeça nervosamente, e disse, com o dedo em riste “escuta aqui rapazinho. Saúde é o que você mais vai sentir falta se fizer de novo um comentário desses”.
Saiu e pôs o pé na estrada. Para uma caixeira-viajante, Luma tinha um problema sério: enjoava toda vez que viajava. Bastou andar alguns quilômetros e já teve que se livrar de todo o gnocchi com trufas negras que comera no dia anterior. “Droga”, disse ela. Passou o dia vendendo seus produtos na praça do município de Buri, com um microfone que ela carregava a tira colo.
Na volta, sentiu-se muito mal uma vez mais, jogando fora agora os fantásticos pastéis de Buri. Chegou a seu prédio cambaleando de fraqueza. Antes de cumprimentar o porteiro Kerryson, sentiu sua visão embaçando e desmaiou.
Quando Luma acordou novamente tudo parecia incerto. Acordou numa rede, em meio a coqueiros. Estava numa praia. A sua roupa era um antigo vestido de noiva. E, surpresa: estava com uma aliança. Kerryson caminhava em sua direção com uma água de coco e uma tapióca.
“Mas o que que é isso, Kerryson?” “Olha, a senhora desmaiou. Eu achei que foi uma jogada sua, uma deixa para eu te laçar, já que a senhora e saúde tão sempre juntas. Então aproveitei que a senhora estava se fingindo de desarcodada, levei pra igreja e já providenciei nossa lua-de-mel. Agora estamos aqui. Já quer fazer nossos primeiros meninos: o Kerryson Jr. e a Lumason?”
Luma ficou boquiaberta. Pensou em pedir socorro, em chamar a polícia. Mas vendo a sinceridade de Kerryson, aquele mar azul, disse baixinho para o rapaz: “Pre-pa-ra que agora é a hora”!